Até o final do século XVIII, a indústria no Brasil estava limitada à produção de açúcar e mineração. Durante o período colonial, outras atividades industriais se desenvolveram no país, mas eram secundárias. Na primeira metade do século XIX, os esforços de industrialização foram prejudicados por entraves econômicos e históricos, como a divisão do mercado mundial e a escravidão. A partir de meados do século XIX, a cultura do café se tornou o centro dinâmico da geração de renda no país, e isso produziu as precondições para a modernização do país. A urbanização crescente levou a uma expansão da indústria de construção civil e da oferta de infraestrutura urbana, e as primeiras iniciativas de uso da energia elétrica no país se voltaram para a iluminação e o transporte públicos. As experiências pioneiras no Brasil começaram em 1879, com a inauguração do serviço permanente de iluminação elétrica interna na estação central da ferrovia Dom Pedro II (Central do Brasil), e em 1883 começou a operar a primeira central geradora elétrica movida a vapor em Campos (RJ), inaugurando a prestação de serviço público de iluminação na América do Sul. O uso pioneiro da eletricidade como força motriz ocorreu em 1883, em Niterói, com a primeira linha brasileira de bondes elétricos a bateria.
A partir da intensificação do uso da eletricidade para iluminação pública e transporte público, os setores produtivos começaram a incorporar essa inovação em seus processos industriais. A primeira hidrelétrica brasileira foi construída em 1883 em Diamantina (MG) e outros projetos hidrelétricos foram implantados nos anos seguintes. Em 1892, a Companhia Ferro-Carril do Jardim Botânico colocou em operação a primeira linha de bondes elétricos da América Latina. Entre 1883 e 1900, a capacidade instalada no Brasil multiplicou-se por 178, passando de 61 kW para 10.850 kW, dos quais 53% de origem hidráulica. Os industriais passaram a utilizar crescentemente a eletricidade de origem hidráulica como fonte primária de energia, uma vez que era mais econômica que o carvão importado, e muitas fábricas foram movidas por essa nova opção. No final do século XIX e início do século XX, várias pequenas usinas, principalmente termelétricas, foram instaladas no Brasil para atender à demanda de iluminação pública, mineração, beneficiamento de produtos agrícolas e fornecimento de indústrias têxteis e serrarias. Em 1900, existiam no país doze usinas com capacidade instalada superior a mil HP e várias outras com capacidade inferior. A expansão urbana do Rio de Janeiro e São Paulo atraiu o capital estrangeiro para instalar companhias de serviços públicos, como a São Paulo Tramway, Light and Power Company e a Rio de Janeiro Tramway, Light and Power Company, que exploravam praticamente todos os serviços urbanos de utilidade pública. Em 1907, a usina de Fontes Velha, pertencente à Light, atingiu 24 mil kW de potência, representando 20% da capacidade instalada total do país. O aumento populacional pressionou a demanda por serviços urbanos e fez surgir um mercado interno que justificava a produção interna de bens de consumo. A potência instalada de máquinas acionadas por eletricidade na indústria de transformação passou de 109 mil para 363,3 mil HP, representando praticamente a metade das formas de energia empregadas no setor secundário. Fora do eixo Rio-São Paulo, em 1903, Delmiro Gouveia construiu a hidrelétrica de Angiquinho em Alagoas, destinada a acionar as máquinas da fábrica de linhas e fios e fornecer iluminação à vila operária de Pedra.
Em 1924, a American Foreign Power Company (Amforp), subsidiária da Bond and Share Co., chegou ao Brasil comprando várias pequenas concessionárias no interior de São Paulo. Em 1930, a maior parte das atividades ligadas à energia elétrica estava concentrada nas mãos da Light e da Amforp. Até então, a política econômica do país visava à estabilidade monetária, equilíbrio orçamentário e aos interesses do setor agroexportador, principalmente do café. Entretanto, a crise de 1929 mostrou a necessidade de mudar a política econômica e o papel do Estado no processo de desenvolvimento industrial. O aumento do intervencionismo na esfera econômica resultou em regulamentações para serviços públicos, culminando na criação do Código de Águas em 1934. A partir daí, a União passou a deter a competência de legislar e outorgar concessões de serviços públicos de energia elétrica, antes regidos apenas por contratos assinados com os estados, os municípios e o Distrito Federal. A nova política setorial revê os critérios para estabelecimento de preços dos serviços, determinando que a tarifa seja fixada na forma de “serviço pelo custo”, com remuneração do capital investido baseada no custo histórico das instalações. Essas mudanças foram motivadas pela necessidade de diversificar a estrutura produtiva e atender às demandas da nova classe emergente ligada às atividades urbano-industriais.
O Código de Águas gerou resistências entre as principais empresas de energia elétrica no Brasil devido a mudanças na relação do Estado com a indústria, como estabelecer princípios reguladores mais rígidos e restrições à participação de empresas estrangeiras. A política nacionalista do Código provocou incertezas regulatórias que desencorajaram investimentos dos grandes grupos estrangeiros no país. Como resultado, o Estado ampliou seu papel no setor, passando a investir diretamente na produção de energia elétrica. Na década de 1940, surgiram as primeiras ações em direção a um planejamento econômico estatal, inspirado em modelos estrangeiros, que recomendavam a necessidade de um planejamento mais abrangente da expansão do setor elétrico. O período de 1930 a 1945 foi marcado por mudanças institucionais que levaram à forte centralização das decisões na esfera federal, em coerência com as mudanças estruturais do Estado brasileiro. As dificuldades do governo federal para regulamentar o Código eram reflexo das características monopolistas do setor e da presença majoritária do capital estrangeiro numa atividade que assumia crescente importância para o desenvolvimento econômico.
Após a Segunda Guerra Mundial, o governo brasileiro implementou o Plano Saúde, Alimentação, Transporte e Energia (Plano Salte) em 1947 para coordenar gastos públicos e investimentos de longo prazo, com foco em aumentar a capacidade instalada de energia elétrica no país. Em paralelo, a Comissão Mista Brasileiro-Americana de Estudos Econômicos (Missão Abbink) foi formada para promover a cooperação econômica entre o Brasil e os Estados Unidos, reafirmando a necessidade de desenvolver o setor elétrico com base em poupança privada e propondo a criação de um banco de desenvolvimento. No início da década de 1950, o governo brasileiro negociou com os Estados Unidos a criação da Comissão Mista Brasil-Estados Unidos Para o Desenvolvimento Econômico (CMBEU) para estudar a implementação da indústria pesada, de bens intermediários e de bens de capital. A CMBEU identificou desequilíbrios estruturais na economia brasileira, especialmente nos setores de transporte e energia. Em 1951, o governo brasileiro assinou um acordo de cooperação financeira com o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (Bird) e o Banco de Exportação e Importação (Eximbank) para financiar importações de máquinas e equipamentos necessários aos projetos de desenvolvimento sugeridos pela CMBEU. Em contrapartida, o governo criou o Programa de Reaparelhamento Econômico e o Fundo de Reaparelhamento Econômico (FRE), que foi administrado pelo recém-criado Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE, depois BNDES) em 1952.
O relatório da CMBEU, de 1951, apontou quatro fatores principais para explicar o desequilíbrio entre oferta e demanda de energia elétrica no Brasil: (i) urbanização acelerada, (ii) forte crescimento industrial, (iii) controle tarifário rígido e (iv) mudança na matriz energética, com o deslocamento da demanda de lenha e carvão para energia elétrica e petróleo. As propostas da CMBEU estavam orientadas para que a expansão futura do setor fosse realizada por algumas grandes empresas privadas, com o governo regulando e complementando. O programa elétrico proposto previa uma expansão de 682,9 MW na capacidade instalada para o período 1952-57, mas por falta de recursos, nem todos os projetos foram implantados. Paralelamente aos trabalhos da CMBEU, o governo desenvolveu algumas iniciativas para equacionar a expansão do parque gerador brasileiro. A Lei 2.308, promulgada em 31 de agosto de 1954, instituiu o Fundo Federal de Eletrificação (FFE) e o Imposto Único sobre Energia Elétrica (IUEE) e designou o BNDES como administrador de ambos. Já no governo Juscelino Kubitschek, foi criada a maior parte das companhias estaduais de energia elétrica e de mais uma geradora, a Central Elétrica de Furnas, controlada pelo governo federal e pelo estado de Minas Gerais. A meta de ampliação da oferta de energia elétrica estabelecida no Plano de Metas de JK foi em grande parte alcançada, o que permitiu um rápido crescimento industrial no país.
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) começou a financiar projetos no setor elétrico em 1954, com o apoio ao governo do Espírito Santo para a construção da hidrelétrica de Rio Bonito. Até 1962, o BNDES aprovou 141 operações de crédito para projetos elétricos, representando cerca de 32% das aprovações totais em moeda. A capacidade instalada de geração de energia elétrica no Brasil atingiu 5.729,3 MW no período, dos quais 1.475,1 MW (25,7%) contaram com apoio do BNDES. O banco financiou diversos projetos, incluindo hidrelétricas, termelétricas, redes de distribuição e linhas de transmissão em vários municípios. O período de 1946 a 1962 foi marcado por uma mudança no modelo de desenvolvimento econômico brasileiro, que passou a privilegiar a participação do Estado em funções produtivas, financeiras e planificadoras, e o BNDES teve um papel importante nesse processo, ajudando a financiar projetos de infraestrutura e de instalação da indústria de base. O banco também prestou garantias e avais para obtenção de financiamentos no exterior e teve participações societárias em empresas do setor elétrico.
O período entre o final do governo JK e 1967 foi de transição para a criação das condições institucionais e financeiras para expandir os serviços de energia elétrica no Brasil até os anos 90. Durante este período, foram criados marcos como a Comissão de Nacionalização das Empresas Concessionárias de Serviços Públicos (Conesp), a Eletrobrás e o Departamento de Águas e Energia Elétrica (DNAEE), que ajudaram a planejar, coordenar e administrar o setor. Além disso, a interligação do sistema elétrico brasileiro começou com a entrada em operação da hidrelétrica de Furnas em 1963 e outros sistemas foram interligados nos anos seguintes. Aumentando a complexidade operacional do sistema, o Grupo Coordenador Para a Operação Interligada (GCOI) foi estabelecido na década seguinte para operar otimizadamente o parque gerador.
Em 1971, o governo promoveu melhorias na legislação tarifária para financiar o setor elétrico, incluindo garantia de remuneração do capital investido na tarifa, empréstimos compulsórios e importação de equipamentos. Em 1974, foi instituída a equalização tarifária para estabelecer tarifas iguais em todo o país, ajustando a remuneração de todas as concessionárias. Até 1977, esses níveis tarifários foram suficientes para que todas as concessionárias tivessem a remuneração legal. O BNDES redirecionou progressivamente seus financiamentos para outros setores, apoiando a iniciativa privada, especialmente em projetos da indústria de transformação. Foram criadas subsidiárias para atuar na capitalização de empresas nacionais de setores estratégicos para a economia, incentivando a captação de recursos no mercado. O BNDES, a Finame e a Embramec foram instrumentos decisivos para formar um parque industrial nacional produtor de bens de capital, em especial da indústria de equipamentos utilizados no setor elétrico.
Até o final dos anos 60, importantes projetos elétricos foram financiados pelo BNDES, incluindo hidrelétricas, termelétricas, e sistemas de transmissão e distribuição. No final da década de 70, a trajetória de crescimento equilibrado e auto-sustentado começou a ficar comprometida devido à utilização do setor em políticas para captação de recursos externos e para controle da inflação através de forte contenção tarifária. Isso levou a uma deterioração econômico-financeira das concessionárias, que foram forçadas a realizar grandes obras sem receber a devida remuneração. Além disso, tarifas incentivadas foram estabelecidas para a instalação de indústrias eletrointensivas e para a substituição de energéticos derivados de petróleo. Em 1981, a rentabilidade das concessionárias foi ainda mais afetada pela edição do Decreto-Lei 1.849. A partir de 1987, o acesso a financiamentos internos ficou praticamente vedado por normas restritivas do Conselho Monetário Nacional, e os investimentos dependeram cada vez mais da captação de financiamentos externos. A interrupção dos créditos de organismos internacionais levou a um fluxo negativo entre os empréstimos externos e o pagamento do serviço da dívida. O serviço da dívida correspondera a 20% das aplicações setoriais em 1975, chegando a 50% em 1985.
No final dos anos 80, a política de contenção de tarifas para garantir a remuneração dos investimentos levou a um aumento crescente da dívida na Conta de Resultado a Compensar (CRC), que atingiu US$ 7 bilhões em 1987. Além disso, a Constituição Federal de 1988 acabou com o IUEE e elevou a alíquota do IR das empresas de energia elétrica, o que agravou ainda mais a crise. Os governadores das regiões Sudeste e Sul se recusaram a autorizar o recolhimento dos superávits de suas empresas de energia, o que levou as concessionárias estaduais a iniciarem processos de inadimplência em suas contas de energia comprada das supridoras do Grupo Eletrobrás. Isso gerou um alarmante quadro de inadimplências intra-setoriais e a estratégia político-empresarial do inadimplemento com o sistema. As tentativas de solucionar os impasses não funcionaram e, em 1993, o saldo da CRC alcançou US$ 26 bilhões. Durante o final dos anos 70 e 80, o Sistema BNDES continuou seu apoio a projetos das concessionárias públicas e privadas de energia elétrica, principalmente por intermédio da Finame. O BNDES também participou ativamente do grupo de estudos Revisão Institucional do Setor (Revise), que elaborou diagnósticos com recomendações técnicas para solucionar os problemas existentes. A redução do ritmo de investimento a partir do final dos anos 80 e o crescimento do consumo de energia elétrica a taxas superiores às da capacidade instalada levou ao deplecionamento dos reservatórios, nos períodos secos, acima do nível ótimo operacional. A situação de falência do modelo de financiamento do setor gerou debates permanentes, o que levou à aprovação, em 1993, da Lei 8.631, que estabeleceu profundas modificações nas regras de funcionamento do setor.
A nova legislação no setor elétrico brasileiro, Lei 8.631, teve como objetivo equilibrar a situação financeira das concessionárias de energia elétrica e da União. A utilização dos saldos da Conta de Resultados a Compensar (CRC) ajudou a pagar dívidas e acabou com a remuneração garantida, o que gerou novas dívidas. A lei aumentou as tarifas de energia elétrica para restaurar o equilíbrio econômico-financeiro das concessionárias, mas a recuperação real dos preços foi contida pelos ajustes do Plano Real. O setor elétrico acumulou grandes dívidas e investimentos não realizados, o que levou a uma paralisação de projetos de geração de energia elétrica. A partir da década de 90, a crise econômica e o esgotamento do financiamento do setor elétrico levaram a reduções drásticas nos investimentos. As Leis 8.031, 8.987 e 9.074 estabeleceram os fundamentos do novo modelo, baseado na criação de um mercado competitivo de energia elétrica. A desverticalização da cadeia produtiva separou as atividades de geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, tornando-as independentes. A licitação de novos empreendimentos de geração, a criação do Produtor Independente de Energia, a determinação do livre acesso aos sistemas de transmissão e distribuição e a liberdade para os grandes consumidores escolherem seus fornecedores de energia foram algumas das mudanças introduzidas.
Na década de 90, houve uma série de regulamentações e leis para modernizar o setor elétrico no Brasil e torná-lo mais competitivo, incluindo a criação da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em 1996 e a criação do Mercado Atacadista de Energia (MAE) em 1998. Foi estabelecido um arcabouço regulatório para sustentar o novo padrão de concorrência no setor, mas a transição do modelo estatal para um modelo misto gerou incertezas e adiou decisões de investimento. O BNDES teve sua atuação limitada no setor elétrico durante esse período, devido às restrições impostas ao crédito às estatais.
Durante o segundo período do Plano Nacional de Desestatização, iniciado em 1995, houve a privatização de empresas de serviços públicos, como a Escelsa. Para viabilizar as privatizações das distribuidoras estaduais de energia elétrica, o Programa Federal de Apoio à Reestruturação e ao Ajuste Fiscal dos Estados foi criado, com a participação do BNDES em 20 operações de antecipação de recursos para os estados que comprometeram-se a vender suas concessionárias de distribuição. O BNDES também utilizou novos mecanismos de apoio, como a adoção de project finance para financiar projetos de geração desenvolvidos por consórcios de investidores privados e públicos. Desde 1995, o Banco contratou operações que elevaram a capacidade instalada do setor elétrico em mais de 12 mil MW. O governo criou a Câmara de Gestão da Crise de Energia Elétrica para propor e implementar medidas emergenciais para compatibilizar a demanda com a oferta e evitar interrupções no suprimento, e o BNDES participou desse esforço. O Banco reviu seus procedimentos operacionais a fim de reduzir prazos para análise e contratação de operações e aperfeiçoou o Programa de Apoio Financeiro a Investimentos no Setor Elétrico, além de ratificar sua disposição em contribuir para fortalecer o mercado de capitais pela emissão de debêntures para compor o financiamento de projetos de geração e transmissão de energia elétrica.
A política de diversificação da matriz energética no Brasil teve um impacto expressivo no segmento de gás natural, cujas reservas cresceram mais de 700% entre 1975 e 2000. O gás natural é considerado um energético nobre, com um amplo espectro de aplicações, eficiência térmica e baixo efeito poluidor. Sua participação na oferta interna de energia evoluiu de 2,2% em 1985 para 6,6% em 2001, e sua disponibilidade foi ampliada pela operação do gasoduto Bolívia-Brasil e a possibilidade de integração com países vizinhos. O BNDES tem apoiado projetos de infraestrutura, como a expansão da rede de distribuição de gás canalizado, para ampliar a oferta de termeletricidade baseada em gás natural. O setor elétrico é um importante vetor de crescimento econômico e um pré-requisito para todo projeto de desenvolvimento econômico. Além do potencial hidrelétrico, outras fontes de energia renovável, como a biomassa, energia eólica e solar, também merecem destaque. O BNDES tem um papel fundamental no financiamento de projetos de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica para expandir a infraestrutura energética no país.
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